crónica de Patrícia César Vicente
ilustração de Manuel Branco
Não fiquem já tristes com o título porque pode nem ser mau de todo.
A paixão acontece aos melhores, é o que dizem, mas eu nunca acreditei muito nisso. Escrevi o livro “Perpetuniana” e aí, sim, deu-se a minha verdadeira primeira paixão. E, não, não é a escritora a exagerar sobre a sua linda obra. Leiam mais um pouco e entendam este ponto de vista: A “Perpetuniana” é um romance de mundo fantástico e, como tal, seja qual for o mundo, lá está a tal parte do romance. Cada escritor sente as coisas que escreve à sua maneira. E, no fim de ter escrito o livro, percebi que tinha vivido a paixão dos personagens como se fosse eles. Chorei, ri, sofri e fui feliz por eles. E dei-me conta de uma coisa. Nunca tinha sentido nada assim antes de ter escrito o livro. Mas se fui capaz de sentir tudo aquilo para os personagens, descobri que na vida real eu também estava apta para me apaixonar. É este tópico muito importante que também contribuiu para a minha decisão de avançar para o divórcio. Bom, isto está cada vez melhor, pensam vocês. E pensam bem.
Nunca me tinha apaixonado como tinha escrito, nunca tinha sentido aquelas borboletas que por sinal até dizem que não fazem assim muito bem. Nunca tinha ido ao mar e perdido o pé. Até podia ir ao mar, mas levava umas valentes braçadeiras, uma boa boia, a prancha do INEM e afins. Porque eu nadava, mas sempre em segurança. Até que a certo ponto da minha vida lá pensei que “Bom, cada um é como cada qual e pelos vistos eu prefiro antes assim. Não fui talhada para estas coisas da paixão.” Vieram namoros, depois o namoro sério, o casamento, o divórcio e eu nada. Ao nível da paixão estava bem apenas a escrever livros. E um dia conheço uma pessoa, e tudo muda. E eu, meus senhores e minhas senhoras, rendi-me? Claro que não. Que eu sou pistoleira certificada internacionalmente. Eu não morro, eu mato. Eu não isto e eu não aquilo. Mas dá choques eléctricos quando a pessoa aparece. Parece herpes, que a pessoa diz para si mesma: “Não quero saber, isto já passou” e depois volta a aparecer! A paixão parece aquele herpes que aparece ao canto da boca na véspera de um baptizado de família ou algo semelhante. E depois é sempre tudo envolto em questões, perguntas, dúvidas e não seis que parecem um berbequim que nos perfura a alma em trinta e dois segundos. E o comentário idiota que fazemos: “Espero que não se tenha notado”. O quê? Que as pessoas estão caídinhas mas tendem a resistir. Conseguimos recapitular os episódios ocorridos na nossa cabeça como se fosse a telenovela das oito e dar opiniões sobre como deveríamos ter agido. Mas é que se perde a racionalidade. Algo que sempre foi tão prezado, útil uma vida inteira para quem nunca foi ao mar sem as braçadeiras. Lembro-me de ter falado a uma amiga sobre este meio sentimento e olhou para a minha cara e disse-me: “Estás lixada!” E eu, cheia de convicção, respondi-lhe: “Uma ou duas semanas e isto passa-me!” E acreditei piamente nisso, não fossem já ter passados algumas valentes semanas e a tendência foi para… piorar, ou melhorar, depende do ponto de vista!
Basicamente, a paixão quando nos apanha é como o herpes. Como é que eu sei disto? Herpes, por acaso, nunca apanhei, já o resto… e como é que aconteceu? Não sei explicar, nem como, nem porquê. Mas é mais ou menos como as pessoas que têm herpes, também nunca sabem muito bem nem onde nem quando nem como. Sejam felizes!
Crónica de Patrícia César Vicente para PARQ_78.pdf (parqmag.com)