O tarot em português!

Texto de Roger Winstanley

Numa época em que ressurge o interesse pelo tarot um casal português lançou um baralho que tem despertado grande interesse internacional. Para o Tiago Pimentel e a Ana Fragateiro, fundadores da Credo quia Absurdum, um estúdio gráfico, este não é o seu primeiro baralho de tarot, mas aquele onde puderam aplicar de forma mais alargada o seu conhecimento sobre esoterismo, alquimia e folclore.

Para Tiago, artista plástico é um conhecimento que veio do contexto da historia de arte e do seu especial interesse pela iconografia medieval e temáticas mais esotéricas e obscuras dessa época. A Ana, designer de formação também comunga do mesmo fascínio pelo oculto e misticismo e o desenvolvimento do Terra Volatile foi o pretexto que encontram para porem em prática a criatividade de ambos levando-os a profundar os seus conhecimentos. Dizem que se inspiram muito um no outro mas porque muitas vezes tem interpretações diferentes, o Terra Volatile, acabou por ter a particularidade de ter muitas cartas extras, permitindo a quem as use que crie um baralho mais personalizado.

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1 Podem falar sobre a vossa marca, a vossa estética e que produtos e que tem a venda?

Quando nos conhecemos reparámos que ambos tínhamos um fascínio pelo oculto. Havia uma vontade de saber e estudar mais. O Tiago sempre trabalhou em torno dessa temática, eu como designer, nunca tinha tido essa oportunidade – não é algo que os clientes procuram e precisam para um site ou logotipo.

Entre rascunhos numa mesa de um restaurante, surgiu este projeto. Em que cada design tinha uma temática ou um conceito. Algo que as pessoas pudessem descodificar ou descobrir mais. Queremos aguçar o sentido de curiosidade, ir às raízes do misticismo, do oculto, criar uma partilha com os outros do que sabíamos e que quem se identificasse com estas temáticas partilhasse connosco esse mesmo gosto e conhecimento.

O mercado das artes sempre foi um terreno pantanoso no que toca ao nosso tipo de estética, por isso decidimos lançarmo-nos numa nova direção. Tivemos uma enorme aceitação no mercado internacional e isso levou-nos a abandonar os nossos empregos e a dedicar-nos totalmente àquilo que gostávamos, explorando mais profundamente os temas mitológicos, a alquimia ou semiótica. Também algumas influências da literatura de horror e ficção científica. Acabamos por fundi-las com acontecimentos da atualidade ou, até mesmo com situações pessoais.

Os nossos designs acabam de alguma forma por ser exercícios de auto-conhecimento, onde nos colocamos como personagens nesse teatro alquímico-mitológico. As nossas imagens assentam na sua maioria numa estética que cruza a gravura antiga com diagramas anatómicos, criando uma certa ligação entre o grotesco e o erotismo, sempre num tom provocador e de crítica pessoal. Não conseguimos imaginar uma melhor forma de retratar a tragédia humana a não ser através do charme violento das linhas da gravura. Enquanto que as referências à filosofia hermética ou esoterismo nos guiam por estradas obscuras, é nos diagramas que deixamos pistas para uma melhor compreensão do que fazemos. Queremos levar as pessoas a pesquisar e descodificar as nossas imagens.

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2 Como surgiu a vontade criarem o vosso baralho de tarot – Terra Volatile – e como foi o processo?

O nosso primeiro tarot foi na verdade o “Grand Elixir”, apesar de ter sido feito antes do Credo quia Absurdum existir como projeto. O tarot “Grand Elixir” era um pouco mais obscuro e intenso, com algumas imagens mais fortes e arrojadas, onde pudemos libertar e explorar todas as nossas inquietações. Explorarmos o nosso gosto pelo tarot e a sua simbologia. Ficou a vontade de completar o tarot “Grande Elixir”, que na altura só tinha a arcana maior. A pandemia deu-nos essa oportunidade mas já nenhum de nós se identificava com aquele tarot, por isso decidimos criar um novo baralho. Algo mais pensado, mais racional do ponto de vista da simbologia.
Além disso, era a desculpa perfeita para pesquisarmos e conhecermos ainda mais.

O “Terra Volatile” era de alguma maneira um projeto que sempre esteve na gaveta, que quando tivemos tempo, ganhou asas próprias, e nós deixámo-lo crescer e explorar todas as visões simbólicas que tínhamos. Ao criar um tarot como este, descobrimos e apercebemo-nos de algumas coisas sobre nós, acho que alguma forma incluí-las neste tarot. As pessoas às vezes questionam-se quem somos, que não falamos ou não partilhamos muito de nós, mas na verdade todo o nosso trabalho é extremamente pessoal.A verdade é que temos mais ideias que tempo disponível. Daí o “ Terra Volatile” ter 104 cartas – incluindo um naipe novo inspirado em alquimia -, e mais uma expansão complementar com mais 47 cartas.

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3 , Já existem muitos baralhos de tarot, porque acham que tinham que fazer o vosso?

Quando começámos este tarot, e apesar de todo o estudo iconográfico e simbólico, deixámos a nossa mente fluir. Independentemente do número de tarots que há no mercado, existia uma necessidade pessoal de criar cada carta com o conhecimento que estudamos, mostrar a nossa visão sobre cada arcano. Descodificar cada mistério e adicionar ainda mais vida.

Cada um de nós vê cada uma das cartas de maneira muito pessoal, isso gerou dias atrás de dias de contradição. Mas dessa discordância, dessa visão que é distinta e inerente a cada um de nós, tivemos a ideia das cartas alternativas. No fundo cada um de nós, deveria arranjar um tarot que realmente se identificasse e que se conecte. E por que não ter um tarot com inúmeras alternativas que nos permita escolher a carta que simbolicamente nos chama mais?

Ser inovador ou original é também seguir o próprio instinto, descolando das propostas já existentes. Contudo é difícil conhecer todas as criações, correndo o risco de seguir caminhos já traçados- de qualquer forma correr riscos é o nosso lema e é assim que vivemos, para o bem e para o mal.

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4, o que é que vos fascina no universo do tarot?

Tiago: Esta questão dividimo-nos. Eu sempre fiquei fascinado pela imagética das cartas, era como um conjunto de pequenas obras de arte nas minhas mãos. Inspirava-me ao mesmo tempo que me intrigava. Durante anos dediquei-me à interpretação simbólica na história da Arte e o tarot obcecava-me ao ponto de estar constantemente a tentar encontrar relação entre aqueles símbolos que ao início me confundiam. Fiz várias descodificações de vários baralhos ao longo dos anos, nunca ficando totalmente satisfeito com nenhum resultado. Talvez seja essa constante deceção que me mantém tão próximo ao universo do tarot, na esperança de um dia chegar a compreendê-lo.

Ana: Foi um fascínio praticamente imediato. O meu primeiro “encontro” com o universo do tarot foi quando ainda era pequena (12 anos se não me engano). Desde que vi um tarot Marselha pela primeira vez, quis estudar e saber cada interpretação e significado. Como era algo estranho de pedir aos meus pais para me comprarem, acabei por fazer o meu próprio tarot num papel de impressora – não durou muito, mas ajudou-me a entender que era algo que gostava de aprofundar e saber mais. Acho que me tornei tão ligada às cartas e ao tarot, que de alguma maneira a minha tia se apercebeu e acabou por me comprar um tarot de Marselha que ainda o uso. Desde então, tento sempre conhecer diferentes perspetivas, simbologias e fazer os meus próprios paralelismos. Admiro muito que cada carta “fala” de maneira diferente a diferentes pessoas. Não existe um certo ou errado, ou um manual, e isso, de alguma forma, é mesmo fascinante

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5, Vcs tem planos para criarem novo baralho? Em que se pode diferenciar deste último?

Temos muitas ideias para novas cartas e novas abordagens, mas ainda estamos muito “presos” ao “Terra Volatile” para criar algo realmente diferente. Estamos sempre a mudar de estilos, talvez porque nós próprios mudamos muito as nossas perspetivas e ideais ao longo do tempo. É provável que ao explorar uma nova estética possa resultar um novo tarot daí. Eventualmente, esperamos ter tempo para nos dedicarmos a um novo tarot que vai ganhando forma na nossa mente, mas pode levar até vários anos para concluir.

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@credoquiabsordum

texto de Roger Winstanley para PARQ_73.pdf (parqmag.com)