Entrevista de Diogo Sixx @artsalien6
Fotografia de Inês Barreto
Inês Barreto foi a grande vencedora da última edição dos concorrentes ao prémio ModaLisboa x IED -Instituto Europeo di Design, distinção entregue durante a Lisboa Fashion Week. Actualmente a terminar o mestrado, Inês Barreto é formada em Design de Moda pela Modatex, no Porto. Nas suas criações procura desenvolver particularmente os temas da mente e psique. Aborda a moda não só com um caráter pessoal e íntimo, mas também com o intuito de transcender a ideia de criar roupa, trabalhando sempre através de narrativas que canalizam a sua voz. Inês Barreto interessa-se pelos processos contínuos de criação, nos quais o foco não deverá ser a forma finalizada ou estanque, mas a aprendizagem, exploração e criação contínua através de ligações estabelecidas entre diferentes campos artísticos dos quais a artista retira influência.
1-Dos eventos que te inspiraste na tua última coleção, qual ou quais foram para ti os de mais importância ? E porquê?
A minha última coleção foi motivada por diversos acontecimentos que, ao longo de 2022, me marcaram, principalmente, pela negativa. Se tivesse que reduzir a dois, seriam estes a morte de Vivienne Westwood e a eleição da Shein como a marca mais popular desse ano. Estes acontecimentos acabaram por motivar toda a narrativa da coleção, na medida em que vi o mundo pelo qual me apaixonei a desvanecer, e precisava de me re-apaixonar.
2-Qual o teu ponto de partida na criação do látex da tua coleção? E se é algo que irás continuar a explorar em futuras coleções?
As primeiras vezes que vi látex líquido a ser utilizado foi por artistas plásticos dentro do meu círculo de amigos, que utilizavam este material para as suas peças. Foi quando tive a oportunidade de visitar o atelier de escultura da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto que uma amiga me mostrou amostras deste material, e comentamos que um casaco feito em látex seria algo incrível.
Quando o fiz para a minha coleção final no Modatex e mostrei os resultados ao meu coordenador de curso, ele encorajou-me a fazer mais e, desde então, ainda não parei. O meu objetivo não é prender-me a este material, porque ainda há muito que gostaria de explorar, mas é sem dúvida algo que ainda me vejo a fazer e a aprimorar, pelo menos enquanto me der gosto fazê-lo.
3-Com a tua coleção anterior “Let’s Us Eat cake” o que estás a preparar para a próxima, que surpresas podem nos aguardar?
A minha próxima coleção será feita durante o meu mestrado e, por isso, estou entusiasmada por aprender e explorar novos técnicas, criando coisas totalmente novas, com acesso a outros tipos tecnologias. Tenho como objetivo tirar proveito desta oportunidade que me foi dada (e que muitos não tem) ao máximo! Por isso, acredito que é muito difícil desvendar o que aí vem, uma vez que vai ser o reflexo de toda a mudança que irá acontecer nos próximos meses da minha vida.
4-Como jovem criadora, o que sentes falta neste país, na indústria da moda/têxtil?
Ao longo deste último ano que passou, tenho tido a oportunidades observar o mundo da moda em Portugal num âmbito mais próximo. A conclusão que tenho vindo a retirar é que há pouca hipótese de um jovem criador ser pago pela sua arte, seja por compras, seja por trabalhos remunerados.
Acho que numa fase inicial é nos muito imposto que “borlas” são normais, o que vai desde trabalhos muito mal remunerados (e muitas vezes nem o são), a empréstimos de roupa, que se pode estragar, perder, ou nunca ser devolvida.
Acredito que a exposição é, para artistas nas diversas fases da carreira, usada como moeda de troca. Entendo que seja necessário, mas penso que a falta de equilíbrio entre visibilidade e valorização faz com que começar uma carreira nesta área só seja possível para os privilegiados – quer do background da sua família, ou das agências com quem trabalham, etc.
5-Diz-me três coisas que mudarias na Indústria da Moda em Portugal
A resposta a esta pergunta não é fácil de dar: acho que há muita coisa que deveria ser diferente tanto em Portugal como no mundo, e tanto na moda como noutros setores. No entanto, acho importante destacar que, numa altura em que muitos jovens (e não só!) sofrem com a crise habitacional um pouco por todo o país, investir em moda de autor é a realidade de muito poucos em Portugal.
Por outro lado, sinto que, por vezes, o designer se “perde” no processo de divulgação, o que vai desde não sermos creditados em redes sociais, ao risco que corremos quando emprestamos as nossas criações para uma shoot ou um evento.
Finalmente, não só no âmbito da moda, mas da cultura e arte em geral, sinto que os apoios dados às artes são muito limitados e, embora eu tenha tido a sorte de ter o meu talento reconhecido e apoiado, as oportunidades são poucas, pelo que não vejo o mesmo a ser possível para colegas meus com muito talento.
6-Com as atuais alterações climáticas que a humanidade enfrenta, e sendo a indústria da moda uma das mais poluentes. O que gostavas de poder melhorar?
Sinto que um dos maiores problemas que enfrentamos atualmente passa pela fast fashion e pela forma como é disseminada nesta “era do tiktok”. Poderia falar dos desterros e das estatísticas do aumento dos números do fast fashion, mas a verdade é que antes de olharmos para estes gigantes responsáveis pelo dano causado ao nosso planeta, é importante refletirmos e olharmos também à nossa volta. Sinto que o consumismo extremo está presente no nosso dia-a-dia, e é cada vez mais banalizado por, nomeadamente, influencers. Como resultado das redes sociais, somos influenciados a comprar sempre mais, e a seguir certas trends em vez de descobrir o seu estilo e usar a nossa criatividade para maximizar o uso que damos a uma única peça.