Heartbreak Mixtapes
texto por Miguel Constantino
Mariana Prista, mais conhecida por Y.azz, tem vindo a conquistar o seu lugar no mundo da música portuguesa. Numa primeira fase em colaboração com Margarida Adão, nome artístico b-mywingz, ambas contaram com várias atuações em festivais portugueses. Contudo, em 2021 anunciou a sua carreira a solo com o lançamento do single “Love Language”. Desprevenida de preconceitos e carregada de introspeções pessoais lança mais tarde o álbum “Heartbreak Mixtapes”, repleto de histórias de amor ou de desamores. Y.azz, reflete a sua vulnerabilidade nas próprias criações artísticas de uma forma singular e disruptiva. Miguel Constantino esteve à conversa com a Y.azz de forma a descobrir mais sobre o seu percurso, e de que forma este se reflete, positivamente, nas suas criações.
Após venceres o concurso EDP Live Bands, em 2019, com a b-mywingz, e de terem lançado um álbum em conjunto “Cycles”, o que te inspirou a criares o “Heartbreak Mixtapes” a solo?
Apesar de ter gostado do desafio de criar um álbum em colaboração com a b-mywingz – que tem uma identidade artística tão vinculada e própria – acho que acabei por me limitar um pouco na maneira como abordei certos temas, e mesmo em como comuniquei todo esse álbum pós-lançamento, porque falar por dois nunca é fácil de gerir. Cada pessoa tem a sua perspetiva/experiências que afetam a maneira como interpretamos a música ou a letra.
Quando me lancei a solo foi exatamente por sentir que precisava de criar um espaço na minha arte que fosse só meu, para me dar liberdade para tocar em assuntos mais pessoais e sensíveis e para poder ter essa experiência de crescimento – profissional e pessoal. E até mesmo para me permitir brincar um pouco mais com a música e como a faço. Senti que tinha de lançar o Heartbreak Mixtapes para encerrar um certo capítulo em mim e lidar com alguns traumas que não me fazia sentido escrever sobre num projeto que não era só meu.
Lançaste em 2021 o single “Love Language” que foi o tema escolhido para antecipar o lançamento do EP “Heartbreak Mixtapes”, no início deste ano. Porquê esta música?
É engraçado, não foi a minha escolha inicial, na altura até estava muito inclinada para lançar a Trouble como primeiro single, mas a única certeza que eu tinha era relativamente à Angel Energy – que tinha de sair no dia 14 de Fevereiro – muito antes de saber o que seria o EP em si.
E isto é uma pergunta quase com rasteira porque hoje em dia tenho uma relação muito amor-ódio com esta música. Quando a escrevi saiu-me muito intuitivamente, foi a primeira vez que escrevi sem estar preocupada com metáforas e reflexões introspetivas e tudo aquilo que eu adoro fazer quando escrevo. E, realmente, mudou toda a maneira como escrevo música hoje em dia, deu-me outros olhos para atacar o resto do disco. Porém, sinto-a mesmo como um início, uma intenção, como a busca de uma direção para o universo que criei depois, mas não acho que estivesse tão consciente disto na altura, foi só algo que pareceu certo no momento.
O tema das relações amorosas e as emoções em torno do amor está sempre muito presente no teu trabalho. Consideras este um tema fulcral para a tua arte?
Considero que seria algo que mesmo que quisesse evitar nunca ia conseguir, porque eu sou uma pessoa muito emocional e alguém que sempre teve muita dificuldade em expressar-se na vida real – que é algo que tem vindo a mudar com o tempo.
Sempre senti uma grande síndrome de impostora, como se o que eu tivesse a dizer não fosse importante ou ninguém quisesse ouvir, então impedia-me de falar abertamente ou até de fazer certas coisas, isto fez com que fosse tudo canalizado para a minha arte, e mais tarde para a minha música.
No início, acho que ainda tentei ser mais subtil e impessoal, apesar de ser sempre pessoal para mim, mas acabei por precisar mesmo de ser transparente e mais óbvia enquanto avançava. Depois fiz um EP só à volta deste tema, mas há muito mais para além disso para onde quero canalizar para a minha arte.
E para responder à pergunta – sem dispersar mais – acho que foi importante neste momento focar-me nessa temática. Acho que é sempre relevante falar do coração e ser-se vulnerável na arte e isso, para mim, acaba sempre por passar por relações, por amor e amor próprio. É um tema sobre o qual me vejo a falar no futuro, mas gostava também de abordar assuntos diferentes que me impactam a mim como ser humano e que refletem sobre o que se passa no mundo.
As tuas vivências e as que conheces de outras pessoas tiveram algum papel no teu processo criativo?
Eu adorava ser capaz de escrever sobre qualquer coisa/situação, mas nunca me acho no direito de falar sobre algo que nunca vivi e já que tenho tantos traumas tenho que os aproveitar de alguma maneira (risos).
Mas falando a sério, é muito isso, não seria capaz de explorar a história dos outros para criar algo. E digo explorar no sentido de aproveitar e desenvolver um tema para algo que seria meu. Para mim escrever é um processo muito pessoal e que vive inteiramente na minha cabeça, e é mesmo complicado quando tento fugir a isso, até porque não me identifico e acabo por nunca estar satisfeita com o resultado.
O meu processo criativo alimenta-se de tudo o que já vivi, e é a minha história – partes dela pelo menos-, e não me vejo a sair imenso desse registo na maneira como crio, mas como tudo está em constante mudança é possível que daqui a uns meses a resposta mude.
O mundo sonoro das tuas músicas mostra uma influência de R&B, pop eletrónico e hip hop. Este álbum em particular tem também tons de jazz, o qual sei que aprecias bastante, e algo que se aproxima do chill hop e dancehall. Como fazes para navegar por entre estes estilos? Quais são as tuas inspirações?
Acho que uma das minhas qualidades enquanto artista – se é que lhe posso chamar isso – é não me prender demasiado a géneros musicais. Não gosto de me limitar a nada sem experimentar pelo menos – claro que me identifico mais neste universo de r&b e pop ultimamente.
Contudo, estou sempre mais concentrada em como me encaixar a mim em instrumentais de influências diferentes, do que propriamente em encontrar instrumentais específicos, quando alguma coisa faz um click é disso que eu ‘’vou atrás’’. Relativamente a inspirações, eu sempre disse que quando estou a criar acabo por ouvir pouca música, mas há artistas que admiro imenso como a Dua Lipa, Kendrick
Lamar, Jorja Smith, Tyler the Creator, que são artistas que eu tenho como inspiração pelo universo que criam à volta de cada álbum. É tudo pensado, é um mundo construído para além da música que fazem e eu acho isso incrível, e é algo que adorava traduzir no meu trabalho também.
6- Sentes que conseguiste enquadrar uma certa melancolia no teu característico estilo vibrante e disruptivo?
Acho engraçada a pergunta, porque não é algo que faça intencionalmente, acho que é só uma característica minha como pessoa ser melancólica. Mas agradeço achares o meu estilo disruptivo, nunca me descreveram assim, mas adoro.
7- Para terminar, tens mais alguma coisa preparada para um futuro próximo? O que podemos esperar de ti?
Mais cedo do que até eu estava à espera, tenho um novo single a caminho, e possivelmente mais um EP no final do ano, quem sabe. Não me quero comprometer demasiado a esse statement porque posso mudar de ideias, mas inicialmente o Heartbreak Mixtapes seguia um formato de cassette e tinha o lado A (que foi o que saiu em Fevereiro) e o lado B – que é aquele que estou aqui a guardar enquanto tomo algumas decisões de vida. Mas acho que me faz sentido lançar este ano ainda para dar uma conclusão a esse capítulo da minha vida.
Texto de Miguel Constantino para PARQ_75.pdf (parqmag.com)
Fotografia de Elisabete Magalhães
styling de Raquel Guerreiro e Maria Nobre