WALKography
The Queer Indigo aka Barry Brandon
Texto de Rafael Vieira
Fotografia de Sebastien Navosad
O camaleónico Barry é tão intenso pessoalmente quanto apaixonante são os projectos que lança e desenvolve. O seu quotidiano de andarilho pelo mundo é feito a fazer apresentações muito participadas e partilhadas, um misto de performance e site specific que apelidou de WALKography. Falámos com Barry Brandon aka The Queer Indigo, para saber mais.
Índigo é um tom forte de azul que transmite a ideia de sabedoria, de justiça, etc. Mas é também o nome dado àquelas crianças especiais, que se acredita possuírem características únicas, quase sobrenaturais. O teu nome está relacionado com algum destes conceitos?
Sim, está. Eu identifico-me como uma criança índigo. Eu tive sempre os sentidos apurados e, quando era mais novo, eu descrevia os sentidos como ouvir, ver e sentir. Ao crescer, eu pedi para deixar de ver e de ouvir, então o meu sentir tornou-se muito forte. Eu sou clairsentient, esse é basicamente o meu dom.
Eu vi que andas a espalhar queer joy e fazes com que todos se envolvam. Qual é o chamamento e o processo criativo por detrás de cada WALKography? Como é que as pessoas reagem e participam?
Chamei-lhe WALKography porque eu não diria necessariamente que estamos a fazer coreografia, embora façamos mais do que apenas caminhar. Eu fundi as palavras. O processo é diferente dependendo de diversos factores. Às vezes eu ouço uma canção algures e tenho imediatamente a visão do movimento que pretendo. Outras vezes recupero referências que estiveram latentes na minha cabeça por mais de vinte anos e, por vezes, tenho que procurar um bocado por uma canção gira que me dê a visão de como transmitir a mensagem que sinto que corresponde à vibração da música. Também tento combinar com a vibração da cidade em que caminho.
Quanto ao envolver as pessoas, quando estou a ir para algum sítio e decido agendar uma WALK, anuncio no meu IG com um post e stories que informam as pessoas de onde me podem encontrar. Elas aparecem, eu ensino o movimento, filmamos e criamos queer magic.
Estiveste em Lisboa recentemente, e também em Madrid e Barcelona, agora estás de volta aos EUA, e depois irás para… Estás a espalhar o máximo possível de alegria em todas estas geografias?
Eu estive em Lisboa após Paris e Berlim e fui depois para Barcelona e para Madrid. Agora estou em Nashville para o casamento de um amigo, mas vou partir em breve. Ainda não tenho a certeza para onde vou, pois o meu melhor amigo está quase a fazer anos e pretendo comemorar com ele, seja onde for que ele queira ir, mas ele ainda não se decidiu. Não faço uma WALK em Nashville porque eu queria dedicar esta semana a reconectar-me com amigos, mas todos os sítios aonde vou, faço sempre intervenções!
Nas tuas apresentações, tudo parece pensado ao mais ínfimo detalhe, a música, a coreografia, as roupas, a maquilhagem, os gestos, as pessoas, a envolvente, o enquadramento. Conta-me mais sobre estes preparativos.
A sério? Isso é interessante, porque não há mesmo muita preparação para os vídeos. Para os encontros em que todos são convidados a participar, peço apenas que usem preto. Parte da magia é que há unidade no sentido em que a cor usada faz-nos parecer um clã. Mas como todos têm controlo criativo para se expressarem como desejam, não há processo de aprovação. Quanto a mim, ou uso roupas de lojas em segunda mão ou algumas marcas emprestam-me as peças para que as use como conteúdo. O meu objectivo para o próximo ano, é começar a usar peças de alta costura desenhadas por designers queer de todo o mundo.
Como é que descreverias a tua mensagem, é de espalhar o amor, de praticar a inclusividade, é uma mensagem de visibilidade para os LGBTQIA+, é de empoderamento?
Eu diria que é isso tudo e muito mais. Exigir e ocupar espaço. Permanecer firme enquanto indivíduo e comunidade. Fazer incidir uma luz sobre a nossa bela e diversa comunidade de humanos. Tentar partilhar a importância do amor próprio. Tentar activar a mente para ver além da sua tacanhez e saber que pode fazer-se muito mais, se se souber deixar cair as camadas de mentiras impingidas à nascença e empurradas pela cultura e religião. Partilhar a importância de viver uma vida honesta e transparente para que o mundo veja e receba a nossa beleza individual. Há muitas mensagens que eu espero que sejam compreendidas.
Também criaste e geres a agência «For All Humans», para clientela corporativa, onde fazes curadoria visual e de experiências imersivas. Conta-me mais sobre isto. O teu objectivo é colorir os executivos uma empresa de cada vez?
Sim! Comecei a minha agência no início de 2017, depois de trabalhar como freelancer durante algum tempo. Percebi que a minha voz não era ouvida num nível suficientemente alto quando eu era contratado por uma agência para produzir um projecto. E eu via regularmente as falhas e lacunas na falta de inclusão, de diversidade e de autenticidade nos esforços de marketing. O objectivo da For All Humans é trabalhar com marcas e campanhas a partir da perspectiva de vozes queer.
Fala-me sobre a tua zine «High Femme», algumas imagens no IG são bastante marcantes, o que é que pretendes mostrar?
HIGHFEMME começou como uma personagem há cerca de ano e meio. Com a pandemia, é claro, tudo foi colocado em pausa. Mas também percebi, através da minha página IG, que há imensas pessoas à procura de conteúdo femme, pelo que decidi trabalhar numa zine digital que destaque humanas que residem globalmente para partilhar as suas histórias e criar um espaço edificante para que humanos queer e femme se sintam mais empoderados na sua identidade.
És um sobrevivente de cirurgia cardíaca, o que é certamente uma experiência marcante. Achas que este acontecimento em particular, alimentou a tua razão de ser e a paixão pela vida?
Fazem-me muitas vezes esta pergunta e eu ainda não sei como responder. Eu nasci com um defeito cardíaco congénito e fiz a primeira cirurgia cardíaca com 2 dias de vida. Desde então passei por 8 cirurgias cardíacas, além de muitos outros procedimentos, mas é assim que eu conheço a vida. Acho que há mesmo uma perspectiva adquirida a um nível profundo, em que o amanhã não é garantido. Que aquilo que provavelmente se destaca da minha vida é o viver o momento, procurar alegria, espalhar amor e ser eu próprio. Não consigo imaginar-me a viver doutra maneira.
Queres que as pessoas walk the walk, que caminhem. Mas também que dancem e que sintam. Quais são os teus próximos objectivos e projectos?
Ainda não sei, mas eu avisarei quando souber! Até lá, vamos continuar a criar e a convidar pessoas para se juntarem, e a porem os olhos no belíssimo trabalho da nossa comunidade.
Fotografia de Sébastian Novasad, produção Yolanda Jandira Kiluanji, Muse The Queer Indigo para PARQ71