Texto de Rafael Vieira

As obras de Super Linox tomaram as ruas de Lisboa, Setúbal e outros locais de forma silenciosa, inteira, como se fossem parte integral da cidade. São figuras monocromáticas à escala real, coroando fachadas e vivificando de arte o cenário urbano.

Quando e como foi o momento zero de arranque desse processo, incluindo a criação do teu nome artístico?

Antes do momento zero [de criação] houve toda uma vida. Fazer Escultura era uma necessidade que não podia continuar a ignorar. Em setembro de 2020, instalei uma máquina de lavar cor-de-rosa em cima de um edifício abandonado com leitura da autoestrada, junto às portagens da cidade de Setúbal. Quando essa máquina de lavar foi instalada, havia já todo um plano para uma linguagem e identidade escultórica que não se esgotasse a longo prazo. O «quando» do momento zero deu-se com essa instalação; o «como» foi-se construindo antes, durante anos, com a vida.

Para me fazer um artista livre, precisava de um nome que funcionasse como uma máscara. Um grande amigo chamava-me LINOX quando jogávamos consola online e decidi apropriar-me desse nome. Vinha de um lugar de diversão, liberdade, bondade, amizade, boas energias e respeito. Acredito que tudo o que nasce daí, mais cedo ou mais tarde, tende a prosperar. De modo a salientar todas as minhas convicções, decidi acrescentar SUPER. Ocorreu-me que a minha super-convicção pudesse ser mal interpretada; na altura não me importei e continuo a não me importar. Não se trata de arrogância, mas de amor-próprio e autoestima. Acho que esta máscara se assemelha mais aos óculos de Clark Kent – personagem que tira os óculos graduados da cara e passa imediatamente a ser reconhecido como Super-Homem.

Crias em estúdio as tuas peças, testas diferentes superfícies e materiais, usas referências para as escalas e objectos?

Tenho um atelier onde me aventuro em diferentes experiências com materiais e técnicas com o propósito de alcançar as formas que procuro. Com uma só cor, uniformizo toda uma variedade de materiais, destacando assim o que mais me interessa: a Forma. O meu trabalho escultórico é inspirado e assenta numa metodologia de Smart Working. Não se trata de preguiça; trata-se de uma forma inteligente de trabalhar o tempo e os recursos, adequada à minha realidade, às minhas necessidades e também aos tempos em que vivemos – o nosso tempo é muito mais valioso que o material. Vou-me apropriando de todo o tipo de materiais e objectos que procuram uma vida nova, sobretudo de manequins. De que outra forma poderia instalar estátuas de forma gratuita na rua? A criação de uma estátua através de processos convencionais exigiria meses de trabalho. O meu pragmatismo escultórico cumpre as minhas necessidades e suscita diversas interpretações e sentidos. Por exemplo: o lugar original dos manequins são as montras de loja. Agrada-me que as minhas estátuas comecem por ser bonecos que existem com o fim de posar atrás de uma montra: não somos todos um bocado como estes bonecos?

A minha linguagem escultórica permite-me ser um artista verdadeiramente livre: ninguém me pode impedir de fazer escultura.

Sinto ironia e humor na forma como intervéns e ocupas as ruas e fachadas. Sentes que as tuas peças precisam desse contexto urbano, do diálogo com o observador?

Preciso de ironia e de humor, caso contrário, enlouqueceria ou sucumbiria na tristeza.

O contexto é uma coisa muito complexa. Às vezes, parece-me que o contexto pode ser só um nome, uma assinatura ou um lugar. As minhas obras precisam de contexto tal como qualquer outra obra de arte (ou artista). O contexto onde tenho criado é o urbano, mas há por aí muitos outros contextos com os quais quero vir a trabalhar e outros, se calhar, ainda por descobrir.

Hoje o observador pode ser alguém atrás de um smartphone. Vou sempre interessar-me muito mais pelo espaço real, pelo objecto, pela escala, pela luz e sombra, pela presença e por tudo aquilo que define e potencia a experiência escultórica. O espaço público é o mais abrangente de todos os espaços na medida em que envolve todos os tipos de observador; já numa galeria ou museu, por exemplo, os espectadores, em princípio, vão à procura de Arte e adivinham-se entendidos na matéria; as minhas intervenções no espaço público funcionam um pouco ao contrário: são as esculturas que vão à procura de espectadores. Aparecem nas suas vidas quotidianas, sem aviso. Seja como for, nenhuma obra de arte existe sem observador. Fico muito contente quando sinto que as minhas esculturas encontram observadores.

A aproximação à escala real tem para mim duas características que acho particularmente relevantes: proximidade que cria empatia com o observador e sedução pelas formas e cores.

A escala real, e a intimidade que ela implica, continua a inspirar-me. Interessa-me a força e o poder das ideias, muito além da escala física. Continuo a esquivar-me dessa armadilha do «quanto maior, melhor». As cores são isso mesmo: uma sedução. Mesmo usando cores fortes, há muita gente que passa pelas minhas esculturas e não as vê. Entende-se. A maioria das pessoas vive na correria. A vida é rotineira. É preciso olhar para fora. É preciso desligar o GPS e conectar com o mundo. É preciso alimentar o olhar e o sentido da contemplação.

O que podemos contar contigo para breve?

Enviei recentemente dois velhos dentro de um contentor para a ilha do Faial, nos Açores. Vão aparecer no Festival Maravilha. Talvez faça uma exposição em Lisboa em Outubro.

Como é que alguém te contacta se quiser adquirir uma das obras ou fazer uma comissão ou exposição?

Enviando-me uma DM nas redes sociais que evidencie seriedade.

Os coleccionadores privados que têm investido no meu trabalho têm pelo menos uma coisa em comum: muita coragem. Não só têm a minha gratidão, como a minha admiração. Muitos coleccionadores de arte não investem num artista que não seja representado por uma galeria de arte. Num futuro próximo, talvez não fosse má ideia contar com a intermediação de uma galeria para fazer negócios, fazer exposições e participar em feiras de arte internacionais.

@superlinox