Sangue Novo x ModaLisboa

Texto de Flora Santo @florasq

Fotos cortesia de @lisboafadhionweek

Cada ano, a ModaLisboa destaca dez dos designers mais prometedores da nova geração do país. Esta edição SS24 revelou um elenco fresco e diversificado do qual foram selecionados seis finalistas: Bárbara Atanásio, Isza, Maria do Carmo Studio, Gabriel Bandeira, Diogo Mestre e Çal Pfungst, que divulgarão uma nova coleção em Março. A Parq apresenta-vos cada um dos seis talentos, reflexo do potencial, da criatividade e do entusiasmo da moda emergente portuguesa.

Hoje exploramos o universo teatral de Çal Pfungst no qual se cruzam questões existenciais, influências absurdistas e roupas com poder transformador.

Parq: Quais foram as inspirações para a tua coleção?

Çal Pfungst:

Eu estava a ler The Carrier Bag Theory of Fiction que refere que as mochilas, ou os sacos, vieram antes da espada. Antes de matarmos para comermos, fazíamos sacos, entrelaçávamos coisas para poder pôr o que recolhíamos da natureza. Isto para mim foi muito potente e levou-me a criar um herói cuja a arma é a roupa. Outra inspiração é o Piquenique no Campo de Batalha do Fernando Arrabal. O seu teatro pânico, assim como os absurdistas e os surrealistas influencia-me muito. Nessa peça de teatro temos uma família que vai visitar um soldado ao campo de batalha e fazem um piquenique. Ora o piquenique no século XIX era uma novidade reservada a alta sociedade que incluía comida, bebida e jogos. Faz-me pensar como é que algo tão simples e agora tão comum pudesse ser visto como um privilégio e essa questão inspirou-me.  Uso então o piquenique e o jogo como um pano de fundo figurativo, literal nas bases do vichy, que aparecem como metáfora para a vida. Todos escolhemos passatempos e cada um com o seu placebo enquanto o fim do mundo acontece .

Interessa-me muito criar estes objetos ambíguos passiveis de leitura abrangente, uma condução semiótica. A história deste particular jogador de xadrez que também é príncipe e uma bruxa e uma sandes, é parte do mundo que tenho dentro da cabeça traduzido em objetos que dão leituras múltiplas. A coleção começa com veludo noturno e fofinho, uma abstração de dominós, passa por lagartixas e aranhas cromadas em ceús azuis e de tempestade, num mundo natural antes e depois de nós e acaba num alumínio frio e brilhante com que embrulhas as sandes para o piquenique. Chamei-lhes Sandes de Faraday

Parq: Dê-nos três palavras chaves para definir a tua marca.

Çal Pfungst: Surrealismo, arte, e ao mesmo tempo cuidado. O lado de cuidar é muito importante. O lado transformador é importante também. Para mim a cena mais fixe quando estás a vestir a minha roupa é sentires-te diferente, é sentires-te transformado ou sentires-te preparado para outra coisa. Como se fosse uma roupa de super-herói. Havia uma roupa que parecia de feiticeiro e o modelo transformou-se noutra pessoa, tornou-se numa personagem deste meu mundo. 

Parq: Quais são os designers, portugueses ou estrangeiros, que te inspiram mais?

Çal Pfungst: Tem de ser Yohji Yamamoto, Dries Van Noten, Sacai, Undercover, Vibskov, Comme Des Garçons. 

Parq: O que é que desejas para o futuro da moda portuguesa?

Çal Pfungst: Espero um futuro auspicioso em que as pessoas vejam a moda como arte, deem valor a peça, deem valor a estas coisas que eu defendo: desta roupa que transforma, que te pode preparar para coisas. Acho que é importante isso também: roupas mais arrojadas e divertidas, mas que sejam confortáveis.