Low

texto de Carlos Alberto Oliveira

Ao décimo terceiro disco de estúdio, os Low aprofundam ainda o caminho desbravado por Double Negative. Deve-se à continuidade pela procura de novos ângulos, na abordagem abstrata dos temas classicamente enquadrados no SlowCore, inegavelmente a imagem de marca de banda, que faz de HEY WHAT um refrescante bálsamo de novas canções.

Recorrendo novamente ao produtor BJ Burton, a banda usa uma vez mais o ruído eletrónico, distorcendo os átomos das notas, enquanto as vozes de Mimi Parker e Alan Sparhawk sussurram as suas lamentações. A melancolia colora o ambiente, mas a intensidade das letras, como é usual na banda, potencia o poder dos temas.

Embora nunca tenham feito um mau álbum, o predecessor do seu novo disco marca o ponto alto da sua criação. Não será estranho que a banda expanda os caminhos aí traçados. O resultado transporta-nos para um universo alienista de ficção científica onde a tecnologia eletrónica e os instrumentos analógicos funcionam biologicamente. A faixa de abertura do disco, “White Horses”, encaixa-se na perfeição no desbravamento desta paisagem.

Levar a distorção ao limite, misturar texturas sonoras nas matrizes das canções, vestindo-as de um minimalismo absoluto, tornou-se a espinha dorsal das suas canções. “All Night” explora este conceito numa sufocante distorção digital, que ao invés de nos afligir nos liberta. Como quem expande uma imagem digital ao ponto de criar pixéis gigantes, numa libertadora desfocagem de si próprio. A contradição reside neste espaço como se os contrários pudessem convergir para o mesmo ponto.

Os cortes abruptos da melodia, acompanhadas alternadamente pela distorção digital da guitarra, são o olho do furacão dos singles “Disappearing” e “Days Like These”. Embora neste último prolongue o murmúrio das vozes após o clímax da canção, alcançado um pouco depois do meio da mesma. Não deixa de ser impressionante a presença da ternura, e de certa forma a existência de uma candura. Dir-se-ia que são estes os elementos biológicos destas canções.

Vocalmente, “I can’t wait” conjuga como nunca as suas vozes, criando ambientes extraordinariamente etéreos. Esta perfeita simbiose é novamente alcançada em “Hey”, e até mesmo em “Don’t walk away”, impregnando as letras da emoção intensa que estas músicas encerram. Como se de um manifesto extrassensorial se tratasse. Assemelhando-se à quebra de barreiras dimensionais, onde o equilíbrio entre a matéria orgânica e digital possa coexistir. A realidade mora entre estes dois mundos.

“More” é provavelmente o tema mais agressivo do disco. A distorção é rude e crua. A voz é um grito ao céu noturno estrelado. Como um sinal enviado ao cosmos. Provavelmente é por essa razão que antecede o tema final do disco. “The price you pay (It Must Be Wearing Off)” despede-se numa crescente ode com a emoção à flor da pele. Elevam-se as energias fluidas num crescente som supersónico tingido de cores digitais. Explodindo como uma supernova a meio da canção, destruindo o universo obsoleto, para nesse vácuo nascer um desconstruído mundo-novo.

HEY WHAT desafia o tempo e o espaço. A forma e a matéria tal como a conhecemos. O novo disco dos Low é desestabilizador, retira o absolutismo da realidade, não oferecendo resposta às questões existenciais, mas sim novas perguntas, que desafiam as leis da normalidade, do equilíbrio e das forças que o regem. Razão mais do que suficiente para encarar este álbum como um dos mais revigorantes dos últimos tempos.

texto de Carlos Alberto Oliveira para PARQ_71.pdf (parqmag.com)