“บ้าน” – “Home”

texto de Lara Mather

Após ter alcançado sucesso internacional com as curtas metragens “Cães que ladram aos pássaros”, “Balada de um batráquio”(Urso de Ouro em 2016 em Berlim para curtas metragens) e o documentário “Terra Franca” a realizadora portuguesa Leonor Teles estreou a sua primeira longa-metragem de ficção “Baan”(“บ้าน”) no Festival de Locarno em 2023, filme que se apresenta agora na salas nacionais.

Baan mostra a cidade de Lisboa de uma forma real pelos olhos de uma jovem arquiteta “L” que após o término de uma relação, conhece “K” uma rapariga de origem tailandesa, acabada de se instalar em Portugal. Vinda do Canadá, onde tinha sido adotada ali viveu toda a sua vida sem um sentimento autentico de pertença.

Numa junção da Ásia em Lisboa e de Lisboa na Ásia como a realizadora já referiu publicamente, “Baan” (“บ้าน”) reflete a vida atual de uma jovem adulta em Lisboa com todas as suas nuances e complexidades quer no que se refere aos relacionamentos com a nova moda do “ghosting”, quer nos problemas da precariedade, carreira, identidade. Conseguimos através das suas personagens sentir as suas frustrações e relacionarmo-nos com algumas situações do filme.

“Baan” (“บ้าน”) significa casa em tailandês e enquanto que na curta-metragem “Cães que ladram aos pássaros” Leonor claramente critica a crise de habitação em Portugal com a questão da gentrificação e aumento das rendas, neste filme, apesar deste tema se repetir, tal como o título aponta, é agora um tópico repetido de um ponto de vista mais emocional. Desta vez questiona-se o que significa alguém ser casa para nós e nós sermos casa para alguém, fazendo uma bonita interpretação das relações interpessoais que vamos desenvolvendo ao longo da vida, numa busca constante por encontrar um lugar onde pertencemos, uma comunidade onde somos, pelo sentimento de casa.

Leonor nos seus filmes aborda sempre temas que a inquietam e usa o Cinema como uma forma de expressão das suas opiniões. Não raras vezes disse que fazer Cinema em Portugal é um ato de grande resistência pois o esforço para se conseguir fazer filmes e ser-se ouvido por cá é no mínimo desafiante. Sendo o foco a nível emocional é impossível não reparar nos comentários que são feitos ao longo do filme não só sobre a crise de habitação como sobre a xenofobia que ainda existe contra a comunidade asiática, que infelizmente aumentou com a origem da Covid-19, com a propagação de mensagens de ódio baseadas na ignorância.

Leonor é também diretora de fotografia do filme. A estética faz-nos lembrar os filmes de Wong Kar Wai com as suas cores vibrantes, os néons, os desfoques e uma certa sensação de solidão no meio da cidade. Filmado em película 16mm entre Banguecoque e Lisboa, não existe narrativamente a separação entre estas duas cidades. É como se estivéssemos numa só cidade, numa mistura das duas em que se vêm semelhanças que se mesclam harmoniosamente sem nos darmos conta.

Com Carolina Miragaia, na pele de “L”, sentimos tudo, e até relembramos aquela sensação de vertigem quando alguém nos consegue tirar completamente o chão que provavelmente só se vive aos vinte anos. É impossível não sentir uma empatia imediata com as personagens, pela sua entrega, a inocência e a sensação de coração partido que vivem. Catarina e Meghna Lall que protagoniza “K” levam-nos numa montanha russa de emoções.

Há certas semelhanças físicas entre a personagem “L” com a realizadora e fica a dúvida se a narrativa se prende a uma experiência pessoal que Leonor tenha vivido mas não é um facto claro.

A música não pode deixar de ser falada porque estamos constantemente a ouvi-la ao longo do filme e cada tema que ouvimos reflete perfeitamente esta junção da Ásia com Lisboa, chega mesmo a dar vida à imagem. A banda sonora inclui temas como “I feel for you” de Chaka Khan, “Going to America” de Cheng Qiong Mei, “Voyage voyage” de Desireless mas também “Aiué do Roça Roça” de Némanus, todos temas nostálgicos que criam uma atmosfera romântica misturada com essa frustração de estarmos à procura de algo e de não sermos correspondidos ao mesmo tempo.

Baan é produzido pela “Uma Pedra no Sapato” como todos os filmes da realizadora, e foi escrito por Leonor, com a colaboração da Ágata de Pinho e do Francisco Mira Godinho.