texto de Hugo Pinto
Seja hip-hop, soul, funk, disco ou blues, a segunda noite do Nos Alive ficou definitivamente marcada por estes géneros musicais.
No palco principal, o rapper português T-Rex abriu as hostilidades. Jovem ambicioso, T-Rex enquadra-se no novo hip-hop português. Entram e saem convidados em duetos energéticos e fico com a ideia que T-Rex sabe muito bem o que quer fazer. O seu som tem ritmo e power, as suas rimas, quando se justifica, são incisivas e os seus beats são bem trabalhados. O fim de tarde e o consequente pouco público não o incomodaram. Um grupo de fãs inflexíveis na primeira fila muito contribuiu para isso.
Aquando da apresentação para a imprensa, tive a oportunidade de assistir ao live de um tema da rapper tuga Br!sa. Achei curioso e por volta das 19h, dirigi-me ao pequeno palco Coreto para a sua atuação. Aqui o hip-hop é mais cru. Atua unicamente com um DJ no scratch e beats, o que lhe dá logo aquele ar old-school. Br!sa tenta convencer o pouco público das suas lutas e das consequentes dores. Acho isto um pouco ingénuo, algo comovente até e simpatizo com a sua atitude.
Ashnikko é uma rapper norte-americana que faz um Trap carregado de referências sexuais e motivos algo bizarros. Actua com duas bailarinas, também elas seminuas, em poses no mínimo sensuais e no máximo a roçar BDSM. Os beats são sujinhos, alguns até a beber do metal rock mas é muito fogo de vista. No fundo é uma pop que agrada a teenagers e de que maneira. Mais importante, o som é bem produzido e este hip-hop Atlanta style funciona. Há qualquer coisa de mensagem política mas isso perde-se nos instintos carnais. É uma menina marota esta Ashnikkko.
Objetificação? She owns it! And wears it like a medal.
Aurora na tenda Heineken é um sucesso. Tenda a abarrotar e muita gente do lado de fora só a ouvir e a ver nos ecrans gigantes. Esta norueguesa faz um euro dance simpático, é aquela pop meio etérea que os nórdicos muito apreciam, com qualquer coisa algo gótica e pseudo monumental pois então. No melhor bebe de Kate Bush naquele falsete sensual meio folky. Tudo com a cena electro dançável de agora.
No palco principal, Tyla cancelou e para a substituir veio a jovem Arlo Parks. A britânica atuou num quarteto clássico de baixo, bateria e guitarra. Sendo que o baixista também toca numa tecnologia qualquer. Arlo diz que não vai atuar para tanta gente este verão e está visivelmente comovida.
O som é uma soul inglesa, muito melosa diga-se, a lembrar amores não correspondidos e separações dolorosas. Tudo com muita alma e muito sentimento. É um som que se ouve bem, nada incomodativo, tudo muito tranquilo.
Uma senhora banda acompanha Michael Kiwanuka num dos concertos mais esperados da noite. Novamente numa tenda Heineken à pinha, Kiwanuka atua com três coristas, uma delas toca percussão, mais um baterista e um percussionista. E um guitarrista e um baixista. Kiwanuka lidera, canta e toca violão ou guitarra elétrica
A música é toda ela negra. Seja uma soul infectada de funk, seja um blues rock com southern spirit.
A determinada altura há um vídeo a preto e branco da América profunda dos anos 50 e ocorre-me a blaxploitation e em como este som é profundamente anos 70. Mais Stax que Motown diga-se. Foi um bom concerto, desajustadamente adulto para o que se tem visto por aqui, diz o velho que há em mim.
E eis-nos chegados à superestrela da noite: Dua Lipa. O palco já anuncia que vem aí qualquer coisa de grande: Há as clássicas plataformas metálicas de dois pisos onde mais tarde bailarinos e uma pseudo banda dão o ar e animam o espetáculo. E é isso mesmo, um espetáculo de luz e cor onde não faltam os papelinhos a cair do céu e foguetes a terminar.
O som é a pop que domina as tabelas de vendas. Bebe da soul com máquinas, hiper produzida, onde a parafernália de efeitos faz a delícia dos muitos que vieram exclusivamente para a ver. Um público que se divide entre LGBT e teenagers em êxtase, todos a dançar e a cantar os hits do momento.
Dua Lipa é gira que dói. Sensual e poderosa, de voz doce e afetiva, conduz um espetáculo bem ensaiado que não frustrou as expectativas.
Genesis Owusu actua sozinho na tenda Clubbing. Vem vestido a rigor este australiano de raízes ganesas. Faz uma soul que bebe muito de Prince num concerto que começou num quase dubstep e que durante as primeiras músicas foi a todas as tendências do underground londrino. E se primeiro foi club music depois foi Prince quase assumido. Aquele funk, aquela pose, toda a atitude e todo o look remetem para o baixinho de Minneapolis. Obviamente não é tão genial como mas isso é irrelevante. Owusu tem atitude para dar e vender, o público aderiu e só foi pena a ausência de banda que tornou o palco algo vazio.
Pouco antes das três da manhã começou Floating Points em formato DJ Set. Resisti quinze minutos de tecno 4 por 4. Notava-se aqui e ali algo de inteligente e a tenda cheia de malta da dance music indicava que o set estava a resultar, mas as perninhas doíam-me e a noite já ia longa.
Amanhã há mais.