No fim-de-semana anterior ao fecho deste artigo, a série do Netflix When They See Us, foi distinguida nos Emmy de Artes Criativas com o galardão de Melhor Filme/Série Limitada.
A série relata a experiência dos Cinco Exonerados, previamente explorados pelos media como Os Cinco do Central Park, um grupo de rapazes afro-americanos adolescentes, entre os catorze e os dezasseis anos, que caíram nas garras dos preconceitos e da falta de discernimento, da ganância e do individualismo tão prevalecentes na sociedade capitalista, sendo erroneamente acusados da violação de uma mulher (branca) no dito Central Park de Nova Iorque, em 1989. Não haviam provas físicas que os acusassem (aliás, as que existiam gritavam que os jovens não eram os culpados e foram intencionalmente ignoradas), e os adolescentes não tiveram sequer o direito de voltar a ver a luz do dia ou a despedirem-se das suas famílias – antes de cumprirem as sentenças (variadas, entre 5 a 15 anos) que os mantiveram ilegalmente encarcerados. When They See Us é baseado na história real de Antron McCray (Caleel Harris/Jovan Adepo), Kevin Richardson (Asante Blackk/Justin Cunningham), Korey Wise (Jharrel Jerome), Raymond Santana Jr. (Marquis Rodriguez/Freddy Miyares) e Yusef Salaam (Ethan Herisse/Chris Chalk). Na reunião organizada por Oprah Winfrey e também disponível no mesmo popular website, as vítimas expuseram que estão traumatizados para sempre. Cumpriram, no entanto, um importante propósito. A série, escrita e realizada pela brilhante Ava DuVernay foi nomeada para 16 Emmys no total e causou indignação por todo o mundo. Aconselha-se alguma preparação ao espectador: trata-se de uma descrição emocional e que induz a reflexões fortes e profundas. É difícil mas absolutamente obrigatória.
Mas o que tem este assunto, reflexo tão fiel da voracidade americana, a ver com o nosso pacato país? Um caso como este poderia acontecer em Portugal? Não? Tudo aponta para que poderia. Recentemente, um artigo sobre quotas para as minorias étnico-raciais no Parlamento, escrito por alguém que se teria ocupado de estudar História e publicado num dos principais jornais portugueses – que já nao são nem muitos nem encerram uma agenda variada – chocou o país. Esta era uma absurda carta aberta, repleta de citações grosseiras próprias de imaturos e malcriados, como mulheres de minissaia e pernas abertas na mesa de café. Uma vergonha para a sociedade evoluída e um embaraço para os media portugueses. Alguns ainda tentaram escrever artigos para tentar salvar a situação mas estas foram igualmente tristes. A realizadora Ava DuVernay comentou sobre o propósito do seu trabalho: é importante que as pessoas (que cometem crimes de racismo) sejam responsabilizadas. Essa responsabilidade está a ser realizada através deste produto de entretenimento. Ela, (referindo-se á promotora de justiça Linda Fairsten que trabalhou para condenar os jovens-vítimas) é parte de um sistema que nao está débil, mas que foi criado mesmo assim. Foi criado para colocar umas classes ou culturas acima das outras e criado para controlar. Foi criado para desenhar a cultura num formato próprio para reter algumas pessoas e propulsionar outras. Para lucrar. Para oferecer benefícios políticos e poder a alguns e dispersar outros”. YOUSEF, KEVIN, ANTRON, KOREY & RAYMOND. Eu. Tu. Eles. Nós. Todos.
por Diana de Nóbrega