Texto de Hugo Pinto
A canadiana Feist veio a Lisboa apresentar o seu novo álbum “Multitude” e deu um belo concerto entre a intimidade dos temas antigos à guitarra e o indie rock com teclados.
Noite amena numa baixa de Lisboa carregada de turistas. Ao entrar no Coliseu reparo que há um pequeno palco no meio da plateia onde não há seguranças e mesmo as grades de proteção são escassas. Nota-se que o público é mais velho e que está uma sala composta embora longe de estar esgotada.
Por volta da hora marcada, a gigante tela que cobre o palco principal do Coliseu mostra o percurso dos bastidores até à sala. É filmado do telemóvel de Feist. Pousa o telemóvel, que continua a transmitir, pega numa guitarra e segue uma balada das antigas.
Depois um “It ‘s been a really long time” que comoveu o público, Feist conversa muito e passa o telemóvel a um membro do público que vai filmando o concerto. Tudo muito natural… A música calminha e simples, o público que adere sem histerismos, o som da guitarra acústica que cola bem com aquela sua voz sedosa. São músicas tristes mas doces, histórias de desamores passados, uma certa candura, lamentos sobre a clausura do covid. Há qualquer coisa de Baez aqui.
E depois, é a atitude desarmante… Feist dá muito de si, atua a um metro do público e responde a perguntas, ri-se connosco, passeia no meio de nós cantando uma música à capela, a certa altura dança com alguém, tudo aquilo é muito cru. Ninguém se intromete inconvenientemente porque estamos todos a disfrutar.
Ao fim de uma hora de concerto, sobe ao palco principal e eis que há uma banda. Há teclados e moduladores, baterias e um violino. O som fica mais cheio mas o que se perde em intimidade ganha-se em energia. De repente lembro-me que ela foi dos Broken Social Scene antes de se ter iniciado a solo na viragem do século.
Realce para ”In Lightning”, provavelmente a melhor faixa do novo álbum, onde ela canta em multipistas gravando live com os teclados vintage e uma bateria a acompanhar. Belo tema este e bastante diferente da versão em disco.
Diz então que alguém lhe passou uma nota hoje pra ela tocar uma música, ela faz a vontade e diz que passar notas é giro e analógico. A música é “Let it die”, a linda canção que deu nome ao seu segundo álbum.
Duas horas depois acaba o concerto.
Percebemos então que o jovem “do público” a quem entregou o telemóvel e que passou a noite a mostrar imagens no grande ecrã, faz parte da produção. Desculpamos-lhe o teatrinho e agradecemos a confissão.
Volta um pouco mais tarde para dois temas de encore. Novamente só com a guitarra comove-nos com o seu jeito de cantar. Envelheceu bem a moça.