Texto de Francisco Vaz Fernandes
O Hotel Tivoli, seguindo a sua tradição de promover a arte contemporânea internacional, expõem um conjunto de tapeçarias Dhurrie realizadas a partir de desenhos de Esther Mahlangu. A octogenária da África do Sul, chega a Avenida da Liberdade a partir de Alexandra de Cadaval que assinala o percurso impar da artista. Como refere, a atenção que damos à obra de Esther Mahlangu é fruto de certo relativismo cultural com que passamos olhar o mundo cada vez mais global, a várias velocidades que se complementam. E nesse sentido, a presença de Esther Mahlangu reflete igualmente a falência de uma ideia evolutiva das vanguardas ditadas pelo homem ocidental branco.
Para essa mudança de perspectivas contribuiu em muito a exposição de 1989, Les Magiciens de la Terra, no Centre George Pompidou, comissariada por Jean Hubert Martin que inaugura uma visão mais global da produção de arte, que incluía o que então poderia ser chamada arte primitiva ou tradicional. É nesse contexto que Esther Mahlangu é incluída nessa exposição, tendo sido instalada a sua própria casa com as pinturas morais que executava seguindo a tradição centenária do seu povo. Esta exposição que iria alterar para sempre o panorama das artes, colocando em evidencia muito artistas que até então não tinham qualquer expressão para além de um reconhecimento micro e local. A pintura de natureza geométrica, com grandes contrastes de cores, simbólica, mágica e fortemente visual , depressa suscita interesse e Esther Mahlangu é lançada para um estrelato tanto na Africa do Sul , onde passa a ser um símbolo nacional da cultura pós-apartheid, como internacionalmente.
O encontro de Alexandre de Cadaval com Esther Mahalangu dá-se quando a comissária que residia em Moçambique, interessada por estudos africanos se propõem realizar uma grande exposição panorâmica da arte contemporânea africana no Palácio Cadaval em Évora na qual incluía Esther Mahlangu, até pelo carácter simbólico, de ser mulher e de uma cultura reprimida que durante anos não tinha os meios de se exprimir enquanto identidade. Para o efeito, a artista sul africana é convidada a vir a Évora onde in situ realiza vários morais que ainda hoje se podem ver no Palácio Cadaval.
Dessa relação nasceu a cumplicidade de escutar os anseios de Esther Mahlangu que nunca abandonou a casa onde sempre viveu e que tem como grande preocupação a divulgação do seu legado. Para isso fundou na sua própria aldeia uma escola onde as mulheres podem aprender e prosseguir com o caracter tradicional da sua pintura. Também a divulgação das suas criações tem sido relevante, daí que se tenha chegado a ideia de criar múltiplos de algumas das suas pinturas, a partir da tapeçaria. Foi então proposto uma execução manual em algodão, segundo as tapeçarias Dhurrie na Índia.
No Hall do Tivoli podemos ver sete das 10 tapeçarias previstas no projecto e o que ressalta de imediato é adaptação perfeita ao lugar de exposição parecendo que já pertenciam ao decor do Hotel Tivoli. As obras de Esther Maglangu têm essa dupla magia de não se imporem mas também não de não passarem despercebidas, sobrevivendo ao aparato de um grande hall de hotel.
A propósito da opção pela a técnica Dhurrie, Alexandra de Cadaval acredita que chega a um interessante cruzamento entre duas artes. “Não queria um produto altamente sofisticado. Queria que a mensagem fosse crua, que fosse um trabalho tribal dos dois lados que têm a mesma preocupação de sobreviver. São tradições centenárias que são transmitidas pela sua prática, oralmente e que precisam de ser preservadas”.
Cada tapete tem um valor de 4000 euros e precisa um mês de execução. Cada uma tem um múltiplo de 10.